Entre máscaras e cinzas
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A partir da quarta-feira de cinzas a Igreja Católica em todo o mundo inicia o tempo da quaresma, denominação dada aos 40 dias de jejum e penitência que precedem à festa da Páscoa. Essa preparação remonta o tempo dos Apóstolos em memória ao jejum de Jesus Cristo no deserto e atualmente é reservado para a reflexão e a conversão espiritual. Essencialmente, o período é um retiro espiritual estimulando os cristãos a condutas de oração e penitência em preparação do espírito para a acolhida do Cristo Vivo, Ressuscitado no Domingo de Páscoa. A quaresma é precedida pelo carnaval e este, desde a Antigüidade, é um período dedicado a festas profanas e, também em sua origem, representou o afrouxamento das leis morais.
Nesse ano uma inesperada surpresa antecipou o carnaval no campo político: Por 12 votos a 2 o Supremo Tribunal Federal – STJ decretou no dia 11 de Fevereiro a prisão do governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda e mais quatro pessoas envolvidas em denúncias evidentes de corrupção. Esse desfecho assemelhou-se a uma retirada de máscaras antes do término do carnaval e teve seu início oficial em novembro de 2009 com a operação denominada “Caixa de Pandora” do Ministério Público Federal em conjunto com a Policia Federal, para investigar caixa dois de campanha e distribuição de propina para a quadrilha instalada no governo do DF.
O STJ decidiu também e, ao mesmo tempo, pelo afastamento do governador do comando do governo. Após uma novela que a princípio anunciava ter o mesmo desfecho das diversas “pizzas” engolidas a seco pela sociedade brasileira em situações semelhantes, surpreendentemente a intervenção do STJ pode abrir a possibilidade de reversão do nefasto quadro de impunidade que os casos de corrupção política, suborno e formação de quadrilha tem tido no nosso contexto político. Todo o país assistiu ao registro vergonhoso de cenas explícitas de arrecadação e distribuição de propinas em Brasília e, por isto é, sem dúvida nenhuma, uma decisão que confere esperança aqueles que se sentem enojados desse jogo mafioso.
Embora seja raro e pouco duradouro já presenciamos a prisão de políticos por razões semelhantes, mas como fênix esses personagens morrem, mas após algum curto espaço de tempo renascem das próprias cinzas e por serem recalcitrantes perseveram no mesmo vício. Por vivermos em um país que possui a triste, mas real denominação de ser um dos mais corruptos do planeta, esse acontecimento é um marco em uma batalha que sabemos muito difícil de vencer: a corrupção entranhada em nosso sistema político.
Temos a esperança de ver cair por terra a máscara dos criminosos que se arvoram impunemente no sistema criado e controlado por eles próprios que garante o acesso político aos que tem ficha suja alimentando sistemicamente a corrupção generalizada. Esperamos que pela primeira vez após tantos casos da mesma estirpe jogados no baú da impunidade estejamos, finalmente, assistindo a oportunidade histórica de moralizar a política brasileira. Para tanto o acontecido às vésperas do carnaval deve alimentar a reflexão de toda a sociedade sobre os danos morais e materiais que o esquema de corrupção política tem exercido sobre nossas vidas.
Que a simbologia cristã da fênix presente em diversas obras sacras do cristianismo em todo mundo, esteja vinculada apenas e exclusivamente à ressurreição de Cristo e não alimente mais o retorno daqueles que representam o pior de nossas relações políticas e sociais.
Regina de Faria Brito